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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Lei baiana que proíbe expiração de crédito de celular é inconstitucional, dizem especialistas

A proibição do limite de tempo para utilização de créditos ativados de telefones celulares pré-pagos na Bahia, em vigor desde a última sexta-feira (7) por força da Lei nº 14.228, promulgada pelo presidente da Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA), Nelson Leal, pode ter uma vigência bem breve no estado e invalidar mais de três anos de tramitação, já que, como apontam especialistas, o fato de avançar em um tema de competência exclusivamente federal, a torna inconstitucional. A proposta é iniciativa do deputado estadual Alex da Piatã (PSD) e foi aprovada pelo Plenário da Casa legislativa em dezembro de 2019, após ser votada por dispensa de formalidades.
Para o advogado Saulo Daniel Lopes, especialista em Direito Civil, com atuação concentrada em Direito do Consumidor, a lei é controversa, pois, apesar de o Estado ter competência para legislar sobre as questões relacionadas à defesa do consumidor, as telecomunicações é matéria específica da União.

“Entendo que essa é uma lei inconstitucional porque viola a competência da União de legislar privativamente sobre telecomunicações. A implicação prática disso é que a lei está valendo, é aplicável, é vigente, até que seja declarada inconstitucional. Até que o STF [Supremo Tribunal Federal] faça esse controle da constitucionalidade. Mas isso depende da provocação”, esclareceu Lopes ao Bahia Notícias. 

Ao listar as competências exclusivas à União, o Artigo 21 da Constituição Federal, em seu inciso XI restringe o direito de “explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais”

Já Fábio Periandro, doutor em Direito Público, com ênfase em Direito Constitucional, avaliou que, a única forma que, em princípio, permitirá essa lei vigorar, é fazer uma análise tomando por base o Artigo 24 da Constituição. “Tem de fazer uma análise porque eles podem incluir o Artigo 24 da Constituição e encontrar alguma coisa que envolva, que dê competência para os Estados de atuar lado a lado com a esfera federal. Eles podem usar a lei estadual como se fosse um complemento dessa legislação federal”

Periandro alertou ainda para o fato de o Código de Defesa do Consumidor, em que se baseia a lei baiana, ser também uma norma federal, mas hierarquicamente inferior à Constituição. 

O texto da lei, publicado do Diário Oficial deste sábado (8), toma por base a Política Nacional das Relações de Consumo, instituída a partir de 1990 com a conformação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e afirma que a "vedação tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como transparência e harmonia das relações de consumo”

O descumprimento da medida sujeitará as operadoras às sanções administrativas previstas no art. 56 do CDC, acrescenta o texto. O artigo em questão lista 12 tipos de punições previstas, a exemplo de multa, suspensão temporária da atividade, revogação de concessão, intervenção administrativa, cassação do direito de licença da atividade, entre outras. No caso da lei baiana, o cumprimento das disposições será fiscalizado pelos órgãos e entidades de proteção e defesa do consumidor.

Ao Bahia Notícias, o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e do Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTeleBrasil), que representa as operadoras no estado, ponderou a nova legislação estadual, que, segundo a entidade representativa, toca diretamente a "liberdade" de atuação das operadoras. 

“O Sinditelebrasil entende que a liberdade das operadoras de atuarem com diversos modelos de negócio é positiva para o consumidor e qualquer lei que limite essa prática pode gerar impacto no preço final dos produtos e serviços, além de interferir em novos investimentos no setor de telecomunicações”.

A entidade não informou, no entanto, se pretende contestar a matéria junto ao STF.

O órgão federal tem sido incisivo na suspensão de leis semelhantes  que visam legislar, no âmbito estadual ou municipal, sobre o setor. No caso da Bahia, já foram suspensas pelo STF proposta que obrigavam operadoras de telefonia celular a instalarem equipamentos para bloqueio do sinal nos estabelecimentos prisionais e outra que proibia a cobrança de assinatura básica. Nos dois casos, a justificativa da Corte afirmou que as normas têm vício  formal de iniciativa, visto que a matéria é de competência privativa da União. 

RESOLUÇÂO FEDERAL 
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) delega às operadoras a decisão sobre a validade dos créditos, firmando, porém, o tempo mínimo de 30 dias para a sua vigência e a renovação destes a cada nova recarga. O órgão regulador determina ainda que a informação sobre o prazo de validade dos créditos deve estar disponível ao consumidor previamente à sua aquisição, inclusive nos pontos de recarga eletrônica. Para além, afirma que o consumidor deve ter à sua disposição recurso que lhe possibilite a verificação, em tempo real, do saldo de crédito existente, bem como do prazo de validade, de forma gratuita. A regulamentação da forma de pagamento e vigência dos créditos para uso do serviço pré-pago está disposta nos Artigos 67 a 72 da Resolução 632/2014 da Anatel. 

TRAMITAÇÃO
A proposta de vedar a imposição de limite de tempo para a utilização de créditos ativados de telefones celulares pré-pagos foi apresentada pela primeira vez na AL-BA em setembro de 2011, de autoria da então deputada estadual Maria Luiza Laudano. O projeto de lei seguiu o rito de tramitação da Casa até fevereiro de 2015, quando solicitado um pedido de arquivamento, após Laudano não ser reeleita. 

Seis meses depois, em agosto de 2015, a proposta – PL. 21.453/2015 -  foi reapresenta pelo deputado Alex da Piatã. Desde então, atendendo aos ritos internos da AL-BA, passou pelas comissões de Constituição e Justiça; Infraestrutura, Desenvolvimento Econômico e Turismo; Defesa do Consumidor e Relações de Trabalho e Finanças, Orçamento, Fiscalização e Controle.  

Ao longo da tramitação, foi distribuída a dois relatores. Inicialmente ao então deputado Pablo Barroso, o qual concedeu parecer contrário à matéria em junho de 2016. Em 3 de dezembro de 2019, a matéria foi novamente distribuída a um novo relator, desta vez, o deputado Antônio Henrique Júnior. De acordo com o site oficial da AL-BA, o projeto foi devolvido 14 dia após, em 17 de dezembro, sem apresentar parecer.  

Ainda assim, o 21.453/2015 teve o requerimento de dispensa de formalidades, quando as bancadas de situação e oposição apreciam a matéria sem utilizar o tempo formal de discussão, aprovado em Plenário no 17 de dezembro. Sendo, enfim, incluído na Ordem do Dia e aprovado pelos parlamentares baianos em 19 de dezembro.

Por Mari Leal / Bahia Notícias

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